sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Tendências culturais em Portugal: entre o Naturalismo e as Vanguardas. O Modernismo em Portugal

Dado o contexto político e social em que Portugal viveu nas primeiras décadas do séc. XX – crise da monarquia, implantação da república, participação na 1ª Guerra Mundial – tornou-se difícil acompanhar a evolução artística que decorria na Europa.
Por outro lado, os portugueses permaneciam ligados aos padrões estéticos tradicionais (pouco público consumidor de bens culturais – baixa alfabetização, falta de hábitos culturais e fraco poder de compra; gosto generalizado pelo naturalismo; atraso crónico português quanto aos movimentos culturais europeus).
Deste modo, nas primeiras décadas do séc. XX, Portugal continuava a viver as tendências culturais do século anterior, com apego à tradição (busca pela identidade nacional). Mas, seria no debate ideológico do início da República e no meio da natural agitação política, que se começariam a sentir “ventos de mudança”, ao nível da literatura e das artes.
Um grupo de escritores e pintores, bolseiros em Paris, onde se apaixonam pelos movimentos vanguardistas, vão constituir a geração dos modernistas portugueses.

1º Modernismo

Atacando a sociedade burguesa nos seus valores e gostos culturais, são marginalizados das exposições e publicações oficiais. Têm de recorrer aos seus próprios meios para se manterem à revelia das regras académicas.
Este movimento estético surgiu numa primeira fase em 1911 com a «Exposição Livre», em Lisboa, protagonizada por vários pintores bolseiros em Paris, cujas obras eram constituídas por naturezas-mortas, paisagens e retratos, sobretudo humorísticos, satirizando a situação política e social.
Caracterizou-se pelo culto da modernidade que dominou a mentalidade contemporânea. Os seus seguidores privilegiavam a novidade relativamente ao estabelecido, a aventura face à segurança. Apesar da modernidade ainda não ser muita, mas era já uma nova maneira de conceber a pintura (estilização formal dos motivos, contraste das cores, esbatimento da perspectiva) que escandalizaria o mundo artístico português da época. “Existe em França uma série de malucos em arte que inventa toda a espécie de extravagâncias…” crítica à exposição livre.
Com o início da 1ª Guerra Mundial, dá-se o regresso de um grupo de pintores, radicados em Paris - Amadeo de Souza-Cardoso, Eduardo Viana, Santa Rita-Pintor. Criaram-se então dois núcleos culturais:
1- Em Lisboa, liderado por Almada Negreiros e Santa Rita a que se juntaram Fernando Pessoa e Mário de Sá Carneiro tendo criado a revista ORPHEU – metáfora de uma geração de homens que querem esquecer o passado e centrar as suas atenções no futuro.
2- No norte, um outro grupo à volta de Eduardo Viana, os Delaunay e Amadeo de Sousa-Cardoso.
A saída da revista revela o inconformismo deste grupo de intelectuais face ao conservadorismo geral do país. Pretendem romper com as tradições culturais dominantes, dando a conhecer novas tendências como o Futurismo (eram opositores da República).
Foi neste contexto de rebeldia que aparece a Manifesto Anti-Dantas que surge como resposta às críticas feitas por Júlio Dantas ao grupo da revista “Orpheu”.
É assim, em 1915, que surge o 1.º Grupo Modernista, iniciado e impulsionado pela revista «Orpheu» que escandalizou o público que se mostrou chocado com as inovações que punham em causa o academismo tradicional. Surgiram apenas 2 números da revista, mas a estética modernista publicou outras revistas como «Portugal Futurista», em 1917 (n.º único).
Fernando Pessoa destaca-se com a sua criatividade poética que se transmite através do seu desdobramento em várias personagens (heterónimos) dos quais os mais conhecidos são Alberto Caeiro, Ricardo Reis e Álvaro Campos.

O 2.º Modernismo
Desenvolve-se entre 1927 e 1940 (Ditadura Militar e Estado Novo). O primeiro grupo vai-se desagregando e uma segunda geração de modernistas organiza-se em torno da revista coimbrã «Presença».
Fundada por José Régio, entre outros, este grupo revela-se céptico quanto aos princípios liberais e republicanos e defende a criação de um movimento artístico afastado das doutrinas partidárias. Adeptos do Intuicionismo e da Psicanálise, os escritores da Presença centram as suas obras em análises psicológicas e introspectivas.
Este afastamento político vai suscitar a desconfiança do regime salazarista que os tentará instrumentalizar para os seus fins propagandísticos. A recusa de alguns artistas levará à sua marginalização dos círculos intelectuais oficiais. Procuram, então, novos espaços para se manifestarem (exposições independentes, cafés – A Brasileira do Chiado, e clubes, para além da participação em revistas e periódicos.
A pintura dos anos 30 e 40 é sobretudo pautada por percursos individuais, destacando-se: Almada Negreiros (pintor, desenhador, romancista,…) e Abel Manta (retratista).
A submissão de outros irá condicionar a morte desta 2ª geração de modernistas.

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Portugal no 1º Pós-Guerra


As dificuldades económicas e a instabilidade política e social; a falência da primeira República 1ª República

– 1910-1926 – período conturbado pelos graves problemas sociais, económicos e políticos (comuns à Europa pós-guerra – mergulhada em difíceis condições de vida)
Dificuldades económicas – herdadas de finais da monarquia – indústria atrasada e insuficiente (apesar de algumas melhorias – aumento e diversificação da produção – indústria pesada, conserveira – embora prejudicada pelas dificuldades em termos de vias e de transportes), comércio atrofiado e o predomínio da agricultura, a qual não produz o suficiente para o consumo interno (técnicas inadequadas, excessiva divisão da propriedade).
- Durante a República foram frequentes as desvalorizações da moeda, a balança orçamental deficitária, a escassez de produtos e a inflação.
- Com a entrada de Portugal na Guerra (Março, 1916) a situação económica agravou-se: especulação e racionamentos, crescimento da dívida pública e aumento do custo de vida.
Agitação e descontentamento social – esta situação era particularmente sentida pelos assalariados e classes médias, ameaçadas pelo desemprego e prejudicadas pelo custo de vida.
- as classes populares viviam na miséria, com empregos precários, baixos salários, sem protecção social – sujeitos à exploração do patronato. Daí que em 1919-20 renasça o sindicalismo português através de greves e manifestações, por vezes, com contornos violentos.
Governos republicanos tomam medidas – para apaziguar o operariado e a função pública: semana de 48 horas, seguro social obrigatório (doença, acidente, velhice) e construção de bairros operários
Burguesia não gosta destas medidas (cedências do governo) e face à situação que se agravara com a entrada na guerra, recua no seu apoio à República. Apesar de, muitas destas medidas não chegarem a ser aplicadas, o que ajuda a minar o prestígio da 1ª República.
Crescente instabilidade política – desde o início que a República sofreu a oposição ao regime:
A igreja – revoltada com o anticlericalismo dos republicanos (laicização do Estado – expulsão ordens religiosas, nacionalização bens da igreja, proibição do ensino religioso, registo civil obrigatório e a legalização do divórcio), e tendo o apoio de um país muito católico e conservador dá à 1ª República uma má imagem.
Os proprietários e capitalistas – descontentes com o carácter demasiado popular e social da legislação republicana, receosos de ondas de greves e ameaças bolcheviques, não se mostram interessados em colaborar com o regime.
As classes médias – cansadas da desordem e temendo o bolchevismo e a proletarização da sociedade, anseiam por um governo forte.
Toda esta instabilidade político-social foi-se agravando sem que a República velha (designação do período final da 1ª República) encontrasse as soluções convenientes. Sem grandes tradições democráticas, a República portuguesa caiu num excessivo parlamentarismo, devido ao elevado poder do Congresso, o que explica que, em 16 anos tivesses havido 45 governos, 7 Presidentes da República. As moções de censura aos Governos eram frequentes e provocavam a sua queda. Os partidos multiplicam-se, o próprio PRP (Partido Republicano Português) dissolve-se e dá origem a várias facções embora da mesma área política, das quais as mais importantes: Partido Democrático – chefiado por Afonso Costa; Partido Evolucionista de António José de Almeida; Partido Unionista ou União Republicana de Brito Camacho.
Mas ainda havia os Independentistas, os Socialistas, os Governamentais, os Reconstituintes, os Católicos, os Esquerdistas e os Monárquicos, entre outros. Com tantos partidos era difícil obter a maioria dos votos, sendo essa instabilidade governativa apontada como causadora da queda da 1ª República (1910-1926), a par do facto de todas as medidas estarem inquinadas, pois as pessoas desconfiavam das reais intenções. Um ambiente assim torna-se propício ao surgimento de soluções autoritárias que já tão divulgadas estavam na Europa desta época.
Foi por isso fácil o derrube da 1ª República através de um golpe de estado militar, em 28 de Maio de 1926, em que o General Gomes da Costa chefia uma marcha sobre Lisboa, colhendo adeptos ao longo do percurso. O Presidente da República, Bernardino Machado, renuncia ao cargo, abrindo caminho para uma nova vida política para Portugal.

sexta-feira, 8 de outubro de 2010

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

As novas concepções científicas


A descrença no pensamento positivista e as novas concepções científicas

No início do século XX, o pensamento dominante, apesar do aumento de vozes discordantes, era o do optimismo positivista, racionalista, que assentava na crença de que as sociedades iriam progredir ininterruptamente. Crença que foi brutalmente destruída pela ocorrência da 1ª Guerra Mundial, pois vem colocar em causa toda esta construção, revelando como, num momento de selvajaria, os homens esquecem toda a civilidade destruindo tudo o que havia levado anos a erguer. Desaparece assim esse Positivismo que impusera a ideia de que a ciência, através do método experimental, tinha respostas para todos os problemas da humanidade. Mas, no início do século XX, verifica-se uma reacção anti-positivista e anti-racionalista, devido às novas perspectivas de alguns cientistas (dando origem a uma nova mentalidade – relativista – em que a única certeza é de que não existem certezas) face ao conhecimento e à ciência:

Contrariando as certezas newtonianas, Einstein demonstra que a “verdade” científica não é universal - é o Relativismo (Doutrina científico-filosófica que afirma a impossibilidade do conhecimento ser absoluto, pois está sempre condicionado às circunstâncias sócio-culturais que o rodeia e às limitações do sujeito que conhece). Esta concepção afasta o determinismo e a previsibilidade dos factos e reconhece que o Universo é instável e misterioso, por isso não tem regras fixas mas probabilidades de resposta científica.

Esta teoria explicava, também que as neuroses (doenças psíquicas) são resultado de recalcamentos (traumas), isto é, impulsos, sentimentos, desejos, instintos naturais aprisionados no inconsciente pelas restrições da moral social. Partindo das experiências do médico francês, Jean Charcot que, através da hipnose, fazia o paciente libertar-se dos traumas, trazendo-os ao consciente, Freud criou um novo método terapêutico (tratamento), assente na livre associação de ideias que deviam fluir naturalmente à mente do doente com a ajuda do médico e na interpretação dos sonhos. Chegou à conclusão de que o comportamento humano também é comandado por impulsos inconscientes, escondidos na profundidade da mente humana (entre todos considerou como dominantes os impulsos sexuais – a libido).
As explicações psicanalíticas (lado irracional da natureza humana) foram conhecidas e muito apreciadas pelo público, em geral, e por intelectuais, em particular, contribuindo significativamente para justificar os novos comportamentos sociais (loucos anos 20) e inspirar alguns movimentos artísticos, ex: o surrealismo.



sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Mutações nos Comportamentos e na Cultura (1ª metade do Século XX)

a) Transformações na vida e na cultura
Nas vésperas da 1ª Guerra Mundial verificava-se uma crescente concentração populacional que veio provocar significativas alterações na vida e nos valores tradicionais do mundo ocidental: um novo modo de viver e de convívio no meio da multidão.

I) Uma nova sociedade
Ao concentrar-se nas cidades, a população abandona hábitos e vínculos sociais anteriores e adquire novas formas de sociabilidade, num ambiente estranho e, por vezes, hostil. Este desenraizamento individual desumaniza e despersonaliza a vida urbana que segue um modelo estandardizado, ou seja, a vida urbana atinge a massificação (género de vida na cidade em que os comportamentos seguem normas, padrões e práticas, tornando as pessoas indiferenciadas) – saída para o emprego, uso dos meios de transporte, viver em apartamentos, compra dos mesmos produtos e realização das mesmas tarefas, nos tempos livres, por ex. (cafés, cinema, desporto).
Surge uma nova visão de ócio e forma de organizar os tempos e espaços dedicados ao lazer e lugares públicos de convívio: jardim, clubes nocturnos, esplanadas, etc. A racionalização e consequente redução do tempo de trabalho, assim como a melhoria do nível de vida, permitiram dispor de tempo e dinheiro para o divertimento e o prazer. Abriu-se um outro ciclo de solidariedade humana e convivência entre sexos, de modo mais ousado e livre, que rompeu com todas as regras sociais impostas até aqui. O ritmo de vida torna-se frenético e o gosto pela acção e pela velocidade é visível pela prática desportiva e uso do automóvel, no aparecimento de novos ritmos como o Jazz, o fox trot ou o charleston, que fazem moda para escândalo dos mais conservadores. As viagens e as férias democratizam-se.
Inicialmente, as mudanças limitavam-se às camadas superiores da sociedade, mas cedo se estendem às camadas inferiores, desejosas de imitar os novos padrões, veiculados pelo novo e poderoso meio de massas – o cinema, não esquecendo o rádio.

II) A crise dos valores tradicionais
O progresso e cultura que dava ao mundo ocidental uma superioridade na viragem do século foi posta em causa pela 1ª Guerra Mundial desmoronando toda a moral burguesa anterior, como referido anteriormente relativamente aos comportamentos.
A morte de milhões de soldados, a miséria e a destruição gerou um sentimento de desalento e descrença no futuro, afectando toda a sociedade. Por outro lado, a massificação da vida urbana, a laicização da sociedade e as novas concepções científicas e culturais são também responsáveis por esta ruptura no padrão de valores e comportamentos sociais vigentes.
Deu-se uma profunda crise de consciência que atinge todos os sectores da vida: na família (métodos anticoncepcionais levam ao controlo da natalidade e à sua redução), no casamento (regulamentação do divórcio torna o casamento mais instável), na moral sexual (dissocia-se da função reprodutora), na religião, no papel da mulher, em toda a conduta social (Anomia social – conjunto de comportamentos desviantes por parte de alguns indivíduos alheando-se das regras impostas pelo grupo – em que este chega a já não distinguir o certo do errado).

III) A emancipação da mulher
O novo papel que a mulher vai ocupar na sociedade é bem exemplo das alterações verificadas. Nos “Loucos Anos 20”, fruto da euforia do pós-guerra (procura de prazer e evasão – anos de recuperação económica, confiança no futuro, desejo de esquecer o horror da guerra), as jovens sobem as saias até ao tornozelo, cortam o cabelo à rapaz, e desafiam as convenções sociais (vida nocturna). No entanto, este foi apenas o lado escandaloso do nascente feminismo (luta levada a cabo pelas mulheres com vista a obter a igualdade de direitos para ambos os sexos) ou da emancipação da mulher.
Este movimento, iniciado nos finais do século XIX, começa por reivindicar certos direitos das mulheres casadas: propriedade dos bens, tutela dos filhos, acesso à educação e a uma carreira profissional, num esforço de tirar a mulher da posição secundária e subalterna que a obrigavam a ter na sociedade burguesa. Já no século XIX, a mulher lutava pelo direito ao voto – Sufragistas (defensoras do alargamento do voto às mulheres / sufrágio universal). Estas destacavam-se através de acções como manifestações e greves de fome.
Em Portugal, em 1909, surge a Liga Republicana das Mulheres Portuguesas e, em 1911, a Associação de Propaganda Feminina com os mesmos objectivos, salientando-se nomes como Ana Castro Osório e Carolina Beatriz Ângelo, entre outras.
As feministas utilizaram várias formas de chamar a atenção (moda, vestuário, cabelo, substituição do espartilho pelo soutien, etc.). Tudo o que significasse uma libertação da mulher em relação aos preceitos tradicionais. Inicialmente, alvo de escárnio e censura, após a 1ª Guerra, as mulheres rapidamente conquistaram as suas reivindicações. Para este facto, muito terá contribuído a força das mulheres e sua adaptação às circunstâncias trazidas pelo conflito mundial, pois estas tinham conseguido substituir o homem em praticamente todas as tarefas. Valorizando as pretensões das mulheres e dando-lhes autoconfiança. Assim, ao terminar o conflito, na maioria dos países, tinham já conseguido tudo aquilo porque haviam lutado antes.
Entre as principais conquistas dos movimentos feministas na final dos anos 20 destaca-se o reconhecimento às mulheres, em muitos países: do direito a votar e exercer funções políticas; pleno acesso aos cargos públicos; igualdade no quadro familiar e no trabalho; o convívio social e frequência dos espaços públicos e todas as conquistas na forma de vestir e apresentar.
É uma emancipação limitada a áreas sociais restritas, no entanto é um passo importante para o caminho que as mulheres terão de percorrer. Nas décadas seguintes verifica-se um certo retrocesso, com a mulher a voltar aos seus papeis mais tradicionais (esposa, mãe, dona de casa), para só nos anos 60 se começar a verificar uma mudança radical, muito por culpa da revolução sexual trazida pela pílula contraceptiva – uma invenção libertadora.
Embora ainda hoje existam algumas resistências, sobretudo na prática, à consignada igualdade da mulher.